quinta-feira, fevereiro 26, 2004

MANIFESTO AOS PORTISTAS

ACREDITEM, a nossa opção é a mais difícil entre todas as possíveis. Embora saiba que nestas coisas não há escolha; a paixão e o amor não se escolhem, por não se localizarem na zona dos interesses.

A voz do coração tem o condão de encantar e tomar conta de nós;
seguimo-la sem pensar em conveniências e medir as consequências.

Mas isto não invalida o julgamento de que ser pelo Porto
é um acto assente na vontade de arrostar com a dificuldade e a revolta.
Porque o antiportismo corre por aí como um esgoto
que vai até à náusea. Porém, nós cá estamos para o desmoralizar.

Se ligarmos as televisões,
qualquer que seja o canal,
só se ouvem loas de lampiões e leões,
num incessante bacanal.

Não afirmam nem cantam sentidas emoções;
só atiram arrotos de pregoeiros, provocadores, ignorantes e aldrabões.

Numa cruzada encanzinada
andam de arma aperrada.
Contra o nosso clube e cidade,
para encobrir a sua incapacidade.

Quando a tudo e todos ganhamos
é sempre com os favores do árbitro que compramos.
Quando somos roubados
os gatunos são encorajados.

De apitadores escabrosos
são feitos juízes corajosos.
Só ainda não conseguiram explicar porque ganhamos no palco internacional,
enquanto eles andam a apoucar o nosso tão querido Portugal.

Temos nome e fama além fronteiras,
em todos os continentes e em todo o sítio e lugar,
nas várias competições cimeiras,
em que não cessamos de nos honrar.

Enquanto eles gastam os dias a urdir
uma cabala para nos beliscar e ferir.
Mas não adianta, eles são assim;
nós visamos ser árvore e eles erva de jardim.

Não ambicionam ganhar a ninguém;
nós jogamos ao Euro e eles ao vintém.

É outra a sua mentalidade
e também a vocação;
nós aprumamo-nos na verticalidade
e eles na rasura do chão.

Ganhar é o problema que ergue o nosso querer;
para eles o dilema é empatar ou não perder.

Se o empate acontece,
a nós deixa-nos estragados,
mas eles festejam dia e noite
como galos emplumados.

Também temos cronistas num ou noutro jornal;
são jóia muito rara e de quilate excepcional.
Lavram textos com substância e superior qualidade,
falhos de jactância e fortes na autenticidade.

Não visam receber encómios populistas,
como os escribas de vão de escada;
não constam no role dos oportunistas,
têm os leitores por gente séria e honrada.

Escrevem com sentido de exigência
e caneta de alma lavada.
Por obrigação de consciência,
presa a uma ética apurada.

Os antiportistas são pequenos no ser, no querer e no pensar e mesquinhos na rasteirice e falsidade do olhar.

E nós desmedidos no sonho e no esforço de ganhar.
E por cima muito rectos no gesto de julgar.

Eles são monárquicos alquebrados
pela volúpia de herdar.
E nós republicanos activos
na atitude de conquistar.

Eles não saem do passado
e da tentativa insana de o reeditar e perpetuar.
Nós trazemos para o presente o futuro desejado
com o engenho de o edificar.

Somos do FCP e da ideia de o elevar.
Eles não têm qualquer meta;
são contra nós sem nada para exaltar.

Temos vida difícil porque almeja a construção;
a deles é muito fácil porque escorre da negação.

Nós olhamos para o céu e vemos azul a todo o momento;
eles não tiram os olhos do breu e só conhecem o cinzento.

Não nos vêem como adversários, mas como inimigos a abater.
Nós rimo-nos dos seus dislates por termos mais que fazer.

Movem-nos a toda a hora uma guerra sem quartel;
como não vencem em campo, usam a mentira fora dele.

Para nós o FCP é símbolo e obra de fervor e religião.
Para eles o antiportismo é causa de alienação.

Nós somos de uma cidade
ao serviço do País e Nação.
Alguns deles sabem a quem servem,
mas muitos outros não.

Nós enfrentamos o calor, a chuva, o frio e o vento.
A eles falta-lhes ânimo e lucidez para entender este tempo.

Atiram-se contra nós com fel, ódio e crispação.
E nós da molhes de troco os feitos da razão.

Seguimos sempre em frente nas asas da ambição.
Eles ficam para trás tolhidos pela frustração.

O clube dos antiportistas é o maior de Portugal.
Mas têm um tamanho que se avista muito mal.

Nós mostramo-nos à luz do dia e da alvura do Natal.
Eles escondem-se nas cinzas e nas máscaras do Carnaval.

Em arremedo de poesia, eis aqui toda a verdade.
Contra o populismo e a demagogia vale a nossa frontalidade.

E isto é só um aviso para a todos mostrar
que sabemos muito bem por onde atacar.

Mas é melhor deixarmos isso para o jogo
e os convocados para jogar.
Porque mesmo no que é sério
temos lugar para o brincar.

E no final para despedir
também os vamos saudar;
o jogo é para sorrir,
não é para amaldiçoar.

Se me quiserem zurzir
recorram ao pensamento;
o acto de me atingir
é que me redobra o alento.



Jorge O. Bento
in Jornal "A Bola", 22 Fevereiro 2004

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